quinta-feira, 29 de outubro de 2015

Quem Precisa de Amor?


Quem precisa do seu amor? Você já se fez esta pergunta? Já parou para pensar que enquanto você está sentado em um restaurante com ar-condicionado durante seu horário de almoço existem pessoas realmente necessitadas? Não me refiro aos milhões de órfãos desabrigados na África ou os refugiados da guerra na Síria cruzando o mediterrâneo em direção a Europa. Falo do porteiro do seu prédio, do irmão que você quase nunca vê por falta de tempo, do sobrinho que não simpatiza porque sempre "queimou o filme" da família, da idosa viúva do andar de baixo. Todas estas pessoas estão próximas, ma talvez você nunca tenha pensado que elas têm problemas e necessidades. É por isso que Martin Buber desenvolveu a noção do eu-tu, que significa tratar o outro sempre como uma pessoa (tu) e nunca como uma coisa (isto).

As vezes as necessidades destes que nos cercam são reais, como o que comer ou vestir, as vezes são abstratas, como carência de atenção. Mas você só vai ser capaz de perceber isso se começar a olhar para os outros como tu, e não como isto. Se agir assim, você pode acabar descobrindo ser o único capaz de ajuda-las, e amenizar seu sofrimento.

Jesus uma vez contou uma parábola desconcertante: "Um homem descia de Jerusalém para Jericó, quando caiu nas mãos de assaltantes. Estes lhe tiraram as roupas, espancaram-no e se foram, deixando-o quase morto. Aconteceu estar descendo pela mesma estrada um sacerdote. Quando viu o homem, passou pelo outro lado. E assim também um levita; quando chegou ao lugar e o viu, passou pelo outro lado. Mas um samaritano, estando de viagem, chegou onde se encontrava o homem e, quando o viu, teve compaixão. Aproximou-se, enfaixou-lhe as feridas, derramando nelas vinho e óleo. Depois colocou-o sobre o seu próprio animal, levou-o para uma hospedaria e cuidou dele. No dia seguinte, deu dois denários ao hospedeiro e disse-lhe: 'Cuide dele. Quando voltar lhe pagarei todas as despesas que você tiver'"

Agora se imagine como um dos ouvintes de Jesus: você já peregrinou mais de uma vez a Jerusalém e conhece bem essa região desértica e perigosa. Sabe como é difícil não topar com assaltantes que se refugiam nestes barrancos e desfiladeiros. É de seu conhecimento também que, esta rota, ao mesmo tempo perigosa, é bastante frequentada. Sacerdotes e levitas passam por ali toda semana depois de terem exercido seus serviços no templo, a caminho de Jericó, importante cidade sacerdotal. Também passam por ali peregrinos e comerciantes com destino a Jerusalém, levando suas mercadorias para a capital.

Ao ouvir falar de um homem assaltado e deixado semimorto na valeta do caminho, você que conhece o lugar e os perigos, sente simpatia e piedade em seu coração. Afinal, é uma vítima inocente, abandonada num caminho solitário e que precisa de ajuda urgente. Este homem poderia ser você! Como não sentir compaixão por ele?

Pare e reflita: na sua vida hoje, quem está sofrendo próximo a você, e que o motivo de dor que o acomete poderia não ter atingido ele, mas sim você?

No caminho daquele homem, felizmente, apareceram dois viajantes: primeiro um sacerdote e depois um levita. Ambos vêm do templo. Já realizaram suas obrigações por lá e estão retornando a sua cidade. O ferido os vê chegar cheio de esperança: são de seu próprio povo; representam o templo, sem dúvida terão compaixão dele. Mas ao se aproximarem, os dois têm a mesma reação: passam pelo outro lado da estrada. Por quê? Têm medo dos assaltantes? Não querem tocar num desconhecido ensanguentado e semimorto para não ficarem impuros (isso os faria ter que retornar e só poderem retomar a viagem dias depois)? Você se sente escandalizado com a falta de compaixão desses dois homens. Como não ajudar um homem abandonado a uma morte quase certa?

No horizonte aparece um terceiro viajante. Não é sacerdote ou levita, não vem do templo. Sequer pertence ao povo eleito. É um odiado samaritano. Provavelmente um comerciante dedicado a seus negócios. O ferido o vê chegar com temor. Pode-se esperar dele o pior. Chegará a liquidá-lo? Mas o samaritano vê o ferido, sente compaixão e aproxima-se dele. Faz pelo ferido tudo o que pode: desinfeta suas feridas com vinho, suaviza a dor com azeite, enfaixa-o para proteger suas feridas da poeira do deserto, coloca-o sobre sua própria montaria, leva-o à hospedaria mais próxima, cuida dele e arca com todos os gastos que forem necessários. Este homem, definitivamente, não parece alguém preocupado com suas mercadorias; assemelha-se mais a uma mãe cuidando com ternura do filho ferido.

Sabe, o conceito abordado por Jesus nesta parábola rompe todas as barreiras. É muito mais profundo do que inicialmente imaginamos. Jesus vê o reino de Deus na compaixão de um odiado samaritano. Já não há classificação entre amigos e inimigos, entre membros ou não de seu corpo (a igreja), entre puros e impuros, entre ricos e pobres. A misericórdia de Deus pode vir de fora do templo, de fora dos canais religiosos "oficiais", pode vir de um inimigo! É desconcertante. Jesus olha a vida a partir da sarjeta, com os olhos das vítimas necessitadas de ajuda. Não há dúvida que para Jesus a melhor metáfora de Deus é a compaixão para alguém ferido. Física ou emocionalmente.

O reino de Deus torna-se presente onde as pessoas atuam com misericórdia. Até um inimigo ou um renegado podem ser instrumento e encarnação do amor compassivo de Deus. A mensagem de Jesus constitui um verdadeiro desafio para todos nós: É preciso esquecer preconceitos e inimizades seculares, é preciso reordenar valores. É preciso estender a misericórdia de Deus a todos e despir-se de valores provincianos de grupos sociais.

A pergunta que você deve se fazer é: "Quem tem necessidade de que eu me aproxime dele, me torne próximo e responda à sua necessidade?" É o sofrimento de qualquer ser humano caído no caminho que nos deve ensinar como agir com amor compassivo.

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